Como parte de um evento sobre mídias portáveis, arte eletrônica e tal, Bruce Sterling (cliquem no link para o currículo) veio palestrar em Belo Horizonte hoje.
Vamos a um pequeno relato do que rolou:
NÃO foi uma palestra literária. Com todos os grifos e estrelinhas. Ele nem mencionou seus trabalhos de ficção.
Era parte de um evento sobre artes digitais – e como o Sterling é um entusiasta delas e também estudioso, foi convidado a falar.
Foi uma conversa sobre urbanismo e urbanização contemporânea, sobre o advento e necessidade da banda larga nas cidades e na relação entre a liberdade oferecida pela internet em oposição aos outros tipos de mídia e seus conglomerados empresariais, assim como os EUA, que já foram campeões da banda larga, hoje ocupam o 17o lugar.
Falou tb sobre as soluções urbanas do Vale do Silício – da prosperidade trazida pela indústria, mas que enquanto Seattle possui infra-estrutura e recursos, o mesmo não é exatamente verdade para o resto da área. Falou sobre modelos de desenvolvimento, sobre os centros de excelência europeus, como Madrid, e como o Brasil também pode tê-los – e como Belo Horizonte, que está se tornando pólo em TI, também poderia se tornar um.
E o papel da internet – como a rede mundial de computadores altera a comunicação, a divulgação de dados e coisital. Fez uma comparação também da internet com uma favela – o google, o facebook, o orkut, o youtube são terra sem lei, onde todos constroem o que querem como querem sem regulamentação e estão à mercê dos “donos” do lugar, como o Facebook, comandado por “um ditador de 26 anos”. Falou da necessidade dos direitos autorais serem repensados e perguntou: “como vocês agem na internet? apenas de maneira lícita?”.
Também teceu comentários sobre as mudanças nas cidades, como Austin, invadida por “alemães vestidos como caubóis – calça jeans, chapelão e botas” e cidades que derrubam o custo de vida para tornarem-se mais atrativas como moradia.
Falou também sobre a crise dos EUA, a influência da política e dos partidos políticos no mundo, disse que não acha ideal o modelo com republicanos, democratas e tea party. E também que “o Brasil vai demorar mais para se tornar os EUA do que os EUA para se tornarem o Brasil”. Falou sobre modelos que mudam e precisam ser repensados.
Também citou a valorização de coisas que foram substituídas pela modernidade mas que são retomadas, como o movimento da slow food. Você espera pela comida, ela vai demorar, mas vai proporcionar uma experiência única. Da mesma forma, como comparativo, poderíamos imaginar um lugar onde tudo tecnológico fosse proibido: celulares, notebooks, câmeras, o que fossem, e onde se projetasse um filme – por rolos – apenas uma única vez. Sobre o quanto a experiência única também poderia ter valor.
Por fim, fez algumas previsões sobre o futuro:
– As pessoas ficarão mais velhas, porque assim é o mundo (e tb porque a natalidade tende a diminuir e os jovens de hoje serão os velhos de amanhã)
– A sociedade ficará mais velha, pois este é o rumo das coisas;
– A qualidade do ar vai piorar;
– No próximos 10 anos Steve Jobs vai morrer ou estar doente demais para continuar trabalhando e não teremos mais brinquedinhos divertidos da Apple…
Depois fizeram perguntas sobre o 4chan e a internet (perdi o raciocínio nessa) e sobre as Unidades de Pacificação nas favelas cariocas e uma certa idealização e estilização para vendê-las como turismo. Tive de sair e não ouvi totalmente a resposta para a pergunta.
Claro que ele falou mais coisas que acabei amalgamando nos tópicos que levantei ou que me passaram batidas, mas em essência foi isso.
Achei INTERESSANTÍSSIMA a palestra, ainda mais porque a expressão do mundo não precisa ser feita apenas pela arte, mas também pela observação, pesquisa e construção acadêmica e prática. Também sobre a internet, essa terra sem lei em que estamos, e os diferentes modelos de cidade pelo mundo. É sempre bom ouvir pessoas que sabem mais, estudaram mais e viram diferente para aprender.
Bom, e uns finalmentes literários:
Com muita vergonha (e quando eu fico envergonhada nem português consigo falar direito, quanto mais inglês) fui pedir autógrafos para meu livro e para o livro do Romeu Martins.
Expliquei para ele que tinha um amigo que morava em Florianópolis que mandou o livro para ser autografado e coisital. Ele achou interessante, autografou e dei o meu (que era um Pirata de Dados que o Romeu me presenteou pela gentileza). Ele autografou o livro e me entregou. No autógrafo, literalmente: “Might even be readable!” – Ou que faça algum sentido hoje. Eu disse que gostava mais de steampunk do que de cyberpunk, ele respondeu que o cyber tem um viés mais político. Disse ainda que a protagonista é uma mulher e que talvez eu goste por isso e que é para eu mandar um e-mail depois dizendo o que eu achei do livro 😛 Achei bem legal!
É bom ver que o artista não precisa prender-se à arte, pode pesquisar e desenvolver muito além dela.
Até a próxima!