ou: por que eu ainda insisto?
ou: por que os autores andam confundindo personalidade forte com grosseria passivo-agressiva?
ou: por que ainda provoco os fanboys em fúria? 😛
Enfim.
Na verdade, comecei a ler esse livro meio enganada. Pensei que fosse uma história meio calcada em mitologia russa, de uma autora não-americana – e gosto bastante de cenários diferentes, de culturas diferentes. Mas meu encanto começou a se quebrar quando descobri que a autora é americana (ainda que nascida em Israel) e a mitologia russa do cenário é rasa como uma pesquisa google + wikipedia. Ou melhor: é inexistente mesmo, é só um cenário pseudo-russo.
E a pesquisa google da autora ainda foi tão malfeita que ela não descobriu que sobrenomes, em russo, concordam com o gênero. Então era só ler Starkov, ao invés de Starkova, que isso me incomodava de um jeito absurdo. É uma coisa boba, eu sei, mas um bom exemplo de pesquisa rasa.
E é essa história: Alina Starkova é uma órfã (claro) (mas se serve de ponto positivo para a autora, a orfandade e a infância em orfanato são exploradas e fundamentais para a trama) que tem como única família o garoto bonitão Maly, seu amigo de infância. O país, de inspirações meio russas, está em guerra com seus vizinhos, e há o exército regular e aquele especial formado pelos grishas, espécie de magos locais que dominam os elementos. Há, é claro, o mal supremo, a Dobra das Sombras, região tomada pela escuridão e por monstros sanguinários, o que só atrapalha as movimentações dos exércitos e representa um perigo em si mesmo.
Só que Alina Starkova é… ISSO MESMO, THE CHOSEN ONE! A pessoa que, sem saber, tem um poder mágico que ninguém mais tem e que pode salvar a todos! /o/ E isso será descoberto por acidente e a levará a ser a preferida do Neguinho Escurinho Darkling, um ser sombrio que é o comandante dos exércitos e governante de fato do país. E agora ela está dividida entre seu novo status social, a paixão adolescente por Maly e a atração irresistível pelo Darkling…
O Darkling em si tinha tudo para ser um personagem mais interessante do que é, muito mais ambíguo e redondo do que acaba sendo. Só que o caminho da Grande Revelação e do afogamento no clichê é mais fácil e prático, então por que arriscar, né? Por que tentar alguma coisa diferente?
Alina é uma chata. Sinceramente, por que autores confundem personalidade forte, cool, com grosseria passivo-agressiva? Ela é grossa com todo mundo ao seu redor, está sempre na defensiva, e pra mim essa é uma atitude muito diferente de ser firme/contestadora. É só falta de educação mesmo. E, lógico, tem um poder imenso e único nas mãos que ninguém nunca sonhou ter.
E uma coisa que é uma falha comum e imperdoável, ao menos pra mim: tratar um mundo de cultura tão exótica nos moldes de uma high school americana fantasiada: a menina popular, os grupinhos e panelinhas, a rival gatchenha (porque é lógico que tem de ter uma rival), os almoços comunitários nos quais seu status se relaciona a onde você se senta… Gente, por mais que sejam jovens, o mundo deles não permite uma high school estilizada – e é tão difícil entender isso? Ou é mais fácil se aproximar do público-alvo (os adolescentes, ou melhor, as adolescentes americanas) e dane-se qualquer coerência e a necessidade de se tornar o cenário crível? Diz-se que o diabo mora nos detalhes, mas esse não é nem mesmo um ponto de menor importância, é algo óbvio na construção do cenário e da própria trama. E pra mim só torna tudo menos crível e mais pobre.
O resto é o óbvio: alguma tensão sexual (só tensão, porque sexo, mesmo fora de cena, entre protagonistas está fora de questão), o checklist básico da jornada do herói e um clímax apocalíptico (tá, isso teve sua boa dose de coisa legal) preparando para os dois próximos livros da antologia, que não lerei. Porque achei esse livro mais do que descartável – já li essa história muitas e muitas vezes antes…
Bom, pelo menos não é tão ruim quanto A Maldição do Tigre, um dos clássicos deste blog…
E o ponto maior é esse mesmo: sei que não sou o público-alvo, mas mesmo quando eu era: por que contar sempre a mesma história? Por que esse apego pela fórmula, em seguir receita de bolo, em não ousar? Acho que foi por isso que gostei tanto de Jogos Vorazes – o ponto alto não é só o cenário de distopia, mas tudo ali, apesar de haver o triângulo amoroso e outras convenções de gênero, foge do formulaico. É muito mais desafiador e a recompensa de leitura muito maior. Não sei, se esse tipo de fórmula batida e pouco alterada é o que tá vendendo, quem sou eu pra dizer o contrário, mas deveria haver mais opções para o público e para o gênero.
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Até a próxima!
As últimas semanas foram especialmente apertadas, mas vou tentar voltar ao ritmo normal do blog, ok?
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